Viajar para a minha pessoa é tão necessário quanto tomar ao menos um bom sorvete no verão ou sopa de ervilha no inverno. Uma daquelas coisas que acabam acontecendo, mas que também podem ser muito bem planejadas. Eu prezo pelos destinos e pelos meus dias de folga. Tenho estratégias e objetivos para cada ocasião, há prerrogativas de toda natureza. Já usei muita desculpa e apliquei os mais eloquentes discursos para convencer quem fosse necessário para me apoiar em meus run aways.
Tudo começou quando em 1989 meu pai ganhou uma bolsa de estudos para fazer a sua especialização na Philadelphia, EUA. Fui levada pela mão e durante três meses chorei todos os dias no intervalo do almoço na escola. Eu, pequena de seis anos, na primeira série, sem poder me comunicar com os colegas, sendo alfabetizada em outra língua. Lembro de dizer aos meus pais que me levassem até o Rio de Janeiro que de lá eu conseguiria chegar a Porto Alegre.
Tamanho foi o trauma que dez anos depois eu meti na cabeça que queria ir fazer intercâmbio na Austrália. Vi o álbum de fotografia de uma amiga que havia passado as férias lá e agilizei toda a papelada para cursar um semestre do segundo ano na terra dos aborígenes. Persuadi meu pai que era o melhor lugar para eu aprimorar o meu inglês. Porque não Estados Unidos? Por que eu já conheço. E Inglaterra? Muito frio e cinza. Nova Zelândia? É mais caro que Australia!
Eu sonhava com praias, calor, mar e surfistas e me mandaram para uma ilha ao sul do país, a Tasmânia. Uma área rural e tranquila, onde o inverno é rígido e o verão tarda em chegar. Inimaginável em se tratando da Austrália. Uma experiência para poucos. Vivi em um lugar em que nunca vi nenhum turista brasileiro e falar português só uma vez por semana, quando ligava para a família.
No meio da faculdade eu determinei que era a vez de ir para a Europa. Pressionada a terminar o curso, fui moldando, planejando e introduzindo uma pós graduação às justificativas da viagem. Em Barcelona descobri o que é morar em um lugar quase perfeito. Fiz amizades que valem ouro, conheci pessoas incríveis, me reconstruí enquanto pessoa. Aprendi sobre arte e cultura de uma forma natural e clara. Mas, principalmente, entendi o que era viajar!
Aprendi a manusear mapas, a me localizar em estações de metro, a fazer malas práticas, a observar as pessoas, a aguentar filas em museus, a curtir um bom passeio e uma bela paisagem.
Recomendo uma viagem en plan solo, sem mais ninguém. Fiz isso na Espanha e nunca me senti tão eu. Não precisa entrar em acordo nas programações, definir rotas e lugares para visitar. Só tu e tu mesmo decide a hora de levantar, almoçar, quanto tempo vais te dedicar em cada lugar e onde vai depois. Viva aos albergues que nunca te deixam na solidão, pois sempre tem alguém ali para conversa. E não há papos mais interessantes do que viajantes trocando dicas e experiências.
Viajar preenche, anima, modifica, faz amadurecer, faz regredir, faz fantasiar, faz criar, pular, soltar, cantar, olhar, beijar, abraçar, amar, encantar e desejar. Desejo poder viajar mais, outra vez, de novo, outro destino, por mais tempo, em outras companhias, com as mesmas pessoas, mais, mais e mais.